“Que tipo de desenvolvimento queremos para os nossos próximos 50 anos?”. Com esse convite, Laura Souza, secretária executiva do Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio) iniciou a mesa-redonda “Reforma Tributária Sociobiodiversa”, na Câmara dos Deputados, no dia 14/06, em seminário integrou a Virada Parlamentar Sustentável.
Ao lado André Tomasi, integrante do Observatório da Castanha – IIEB/OCA, Carina Pimenta secretária Nacional de Bioeconomia do Ministério do Meio Ambiente), Cido Souza, da Cooperativa Grande Sertão (MG) e Presidente da União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária (UNICAFES), e Edna Cássia Carmelio, consultora da GIZ, o ÓSocioBio colocou em pauta no parlamento a necessidade de políticas de tributação adequadas aos produtos das economias de povos e comunidades tradicionais, e agricultoras e agricultores familiares.
Instituído na década de 1960, o modelo de tributação sobre o consumo no Brasil era e ainda permanece bastante confuso e injusto com populações em vulnerabilidade. Neste ano, a pauta da Reforma Tributária voltou com vigor e deverá ser votada no Congresso Nacional. Isso significa que a forma que os brasileiros pagam impostos vai ser alterada por meio das PEC 45/2019 e PEC 110/2019.
A principal mudança proposta pelo governo federal é: os cinco tributos atuais sobre o consumo (IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS) poderão ser substituídos por um imposto sobre consumo, o Imposto sobre bens e serviços (IBS), e por um Imposto Seletivo (IS) – destinado a produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como cigarro e agrotóxicos. Essa é a proposta de reforma tributária que a Câmara está analisando e foi apresentada pelo líder do MDB, deputado Baleia Rossi (SP).
Para contribuir com a Reforma, junto a mais de 70 organizações e especialistas o ÓSocioBio formulou a proposta da Reforma Tributária 3S – Saudável, Sustentável e Solidária, que busca contribuir com a erradicação da pobreza e na redução das desigualdades sociais, regionais, raciais e de gênero. E agora, junto a esse movimento, defende mudanças na forma de tributação que também contemple a sociobiodiversidade brasileira.
“As áreas que concentram maiores incentivos fiscais na tributação são o automobilístico, petróleo e gás, e agrotóxicos, por exemplo. E como resultado tivemos um crescimento econômico no país e também perda da biodiversidade, agravamento na desigualdade social, insegurança alimentar e morte de lideranças socioambientais”, destacou Laura, secretária executiva do ÓSocioBio. “Por isso, acreditamos que é o momento de se pensar novas políticas de tributação, que incluam os produtos da sociobiodiversidade”, completa.
O Observatório defende que haja mecanismo de compensação nos tributos que incidem nos produtos oriundos da produção dessas populações agroextrativistas, que compõem a fase inicial da cadeia. É preciso que a fase de venda dessa produção tenha a compensação referente a 100% do que deveria ser pago pelo novo tributo em debate na Reforma Tributária, o IBS.
Isso significa que o preço da Castanha-da-Amazônia, do Açaí, do Baru, do Pequi, e de outros produtos da sociobiodiversidade brasileira e seus derivados, pode ser mais barato. E que os produtores não vão carregar uma carga tributária desproporcional aos seus lucros. Esses produtos contribuem ainda para a manutenção das florestas e campos vivos, das águas limpas, favorecendo a conservação da biodiversidade e equilíbrio climático.
Audiência pública
Ainda na programação da Virada Parlamentar Sustentável, o ÓSocioBio promoveu, por meio de articulação com o gabinete do deputado federal Airton Faleiro (PT-PA), a audiência pública “Sociobioeconomia, desafios do equilíbrio climático e produção de alimentos saudáveis”, para debater os PL 1855/2022 (Senado), a Indicação n° 42/2022 e o Projeto de Lei Complementar (PLP) 150/2022 (Câmara), com representantes do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Companhia Nacional de Abastecimento (Conab-MDA), Ministério do Planejamento, Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS/ÓSocioBio).
O debate teve como objetivo central pautar a economia da floresta e promover economias pautadas no bem-estar social em conjunto com a conservação ambiental. Durante a audiência, Leosmar Terena, coordenador geral de promoção do bem-viver indígena do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), ressaltou que a economia da sociobiodiversidade é parte integrante das práticas e modos de vida dos povos originários, e não deve ser tratada como uma mera commodity. “Não queremos que a economia da sociobiodiversidade se torne apenas mais um produto, mas sim uma economia verdadeira, que já é praticada pelos povos indígenas há muito tempo”, afirmou.
Rodrigo Augusto, coordenador de Projetos da Secretaria Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais e Desenvolvimento Rural Sustentável do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), enfatizou a necessidade de estabelecer cadeias de valor justas, que remunerem de forma adequada os povos indígenas e comunidades tradicionais. Segundo ele, tudo isso só é possível se houver a garantia dos territórios. “É preciso estabelecer uma cadeia de valor justa que remunere de forma justa os povos indígenas e povos e comunidades tradicionais, e nada disso existe se não existir território”, destacou.
José Ivanildo Gama, diretor do Conselho Nacional das Populações Extrativistas e membro do Observatório das Economias da Sociobiodiversidade, também participou da audiência e ressaltou a importância de políticas públicas que estejam alinhadas com a realidade dos povos da floresta. Ele defendeu a criação de políticas inclusivas. “Devem ser criadas políticas públicas que incluam os modos de vida dos povos da floresta, seus saberes e fazeres. Isso é importante para que o governo possa promover políticas adequadas e contextualizadas a essas realidades”, enfatizou.
Virada Parlamentar Sustentável
A Virada Parlamentar Sustentável é um movimento que busca traçar um futuro próspero para o Brasil por meio de atos, debates, seminários, exposições, audiências públicas e mesas redondas. Os eventos vão ocorrer até 29/06 no Senado Federal e na Câmara dos Deputados, com a participação de mais de 60 organizações da sociedade civil. Saiba mais em: https://viradaparlamentar.org.br/
ÓSocioBio
O Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio) é um grupo de organizações socioambientais da sociedade civil, movimentos sociais populares, empreendimentos e cooperativas de base comunitária e redes dos campos, das florestas e das águas, reunidos em torno da agenda das Economias da Sociobiodiversidade.
O ÓSocioBio monitora as políticas públicas e os projetos de lei, no âmbito federal, além de desenvolver atividades de incidência política, controle e participação social dirigidas ao fortalecimento dos sistemas socioprodutivos sustentáveis e inclusivos de povos indígenas, povos e comunidades tradicionais, e de agricultoras e agricultores familiares.
Texto: Dominik Giusti/ Comunicação ISPN e Tainá Aragão/Comunicação ISA