Por Dominik Giusti
O estímulo ao desenvolvimento das economias da sociobiodiversidade é uma estratégia comprovada de combate ao desmatamento e proteção contra a degradação florestal. Esse tema foi abordado no Fórum sobre Florestas Tropicais de Oslo, realizado nos dias 25 e 26 de junho, em Oslo, Noruega. Promovido pela Agência Norueguesa de Cooperação para o Desenvolvimento (Norad) e pela Iniciativa Internacional Norueguesa de Clima e Floresta (NICFI), o evento bienal reuniu governos de diversos países, setor privado, movimentos sociais e organizações da sociedade civil. Confira a programação completa e os vídeos das discussões no site da Norad.
O evento, só para convidados, contou com a participação de representantes da rede do Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio), como Guilherme Eidt, coordenador de políticas públicas e advocacy do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN); e Kleber Karipuna, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).
De acordo com Guilherme Eidt, o pesquisador e professor da Universidade de São Paulo (USP) Ricardo Abramovay, durante a sessão “Mudança para sistemas alimentares e agrícolas sustentáveis para proteção das florestas – reforma da governação fundiária e alinhamento dos incentivos financeiros”, falou dos impactos dos sistemas agrícolas e a necessidade de diversificar e ampliar o consumo de produtos das economias da sociobiodiversidade.
“Abramovay criticou a monotonia alimentar global, que usa cerca de 15 produtos basicamente. E fez a distinção entre a bioeconomia do agronegócio e as economias da sociobiodiversidade, destacando a contribuição desta para a conservação dos territórios indígenas e de populações locais, e proteção das florestas tropicais e outros ecossistemas”, comentou Eidt.
As discussões do Fórum abordaram ainda questões como em ações nacionais para combater o desmatamento e promover a inclusão social, com participação de ministros do meio ambiente de Brasil, Indonésia, Congo, Etiópia, Alemanha e Peru. Foram abordados temas como REDD+ e financiamento de políticas sustentáveis, soluções inovadoras para as florestas brasileiras, sistemas alimentares e agrícolas sustentáveis, uso de dados de satélite para proteção florestal, crime organizado nas florestas, pecuária sustentável no Brasil, experiências de países da África e da Ásia, e as soluções dos povos indígenas para a crise da biodiversidade e metas climáticas.
“Durante o fórum, foi notória a convergência de análises sobre a importância dos povos indígenas e comunidades tradicionais para a conservação das florestas tropicais. No entanto, para que desempenhem esse papel de maneira eficaz, também foi constatado que é imperativo garantir seus direitos, principalmente os territoriais. Além disso, é fundamental assegurar que os povos originários tenham maior protagonismo no acesso e na governança dos recursos financeiros destinados às iniciativas de proteção e conservação das florestas e outros ecossistemas,” afirmou Eidt.
O Fórum sobre Florestas Tropicais de Oslo também contou com representantes do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e do Banco Nacional para o Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Durante o Fórum, o Governo da Noruega e o BNDES formalizaram uma nova doação para o Fundo Amazônia, no valor de US$ 50 milhões (cerca de R$ 273 milhões).
COP 16
Entre os temas discutidos em Oslo, teve destaque a realização da COP 16 – Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) da ONU -, que será em outubro deste ano, em Cali, na Colômbia. Durante a COP 15, em 2022, foi aprovado o Marco Global de Kunming-Montreal da Diversidade Biológica, (GBF, na sigla em ingês), um novo acordo que possui quatro objetivos e 23 metas para o controle da perda de biodiversidade no mundo inteiro até 2030, incluindo: conservação e gestão efetiva de pelo menos 30% das terras, áreas costeiras e oceanos do planeta. De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) vivemos “um perigoso declínio na natureza como resultado da atividade humana, com a maior perda de espécies desde os dinossauros”.
O ÓSocioBio atua no monitoramento e na proposta de elaboração de uma nova Estratégia e Planos de Ação Nacionais para a Biodiversidade (EPANB), a política pública brasileira alinhada ao cumprimento das metas do novo Marco Global, da qual o Brasil é signatário, e que reconhece “as importantes funções e contribuições dos povos indígenas e das comunidades locais como guardiões da diversidade biológica e participar em sua restauração, conservação e utilização sustentável”. A presidente da COP 16, Susana Muhamad, que é ministra do Meio Ambiente da Colômbia, também esteve presente no Fórum.
A COP 16 também foi pauta de Reunião Estratégica promovida pela Rainforest Foundation Norway (RFN), realizada em 22/06, e que contou com a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Asociación Interétnica de Desarrollo de la Selva Peruana (AIDESEP), Organización Nacional de los Pueblos Indígenas de la Amazonia Colombiana (OPIAC) e Governo Peruano, além de representantes do ISPN, Guilherme Eidt e o especialista em agrofloresta Robert Miller.
“Compartilhamos experiências nacionais de elaboração das EPANB e principais pontos de atenção nos países detentores das maiores florestas tropicais: Brasil, Colômbia, Peru, Indonésia e República Democrática do Congo. A reunião também serviu para maior articulação e preparação para a COP16”, comentou Eidt.
Principais destaques do ÓSocioBio para a revisão da EPANB:
👉🏾 Participação e Inclusão de Povos Tradicionais: a inclusão e participação ativa de povos originários, comunidades tradicionais, quilombolas e afins é essencial em todas as metas. Nada deve ser implementado sem considerar essas perspectivas
👉🏾 Integração de Políticas de Biodiversidade e Clima: há enorme necessidade de integrar leis, planos e projetos que tratem da biodiversidade e do clima de maneira conjunta e intersetorial, ao invés de tratá-los separadamente.
👉🏾 Promoção da Gestão Sustentável das Espécies: é importante focar nas populações vulneráveis e criar um ambiente favorável para a viabilidade da sociobiodiversidade, considerando aspectos naturais, econômicos, sociais e culturais.
👉🏾 Redução de Subsídios Econômicos Prejudiciais: são necessárias reformas tributárias e financeiras para eliminar incentivos a mecanismos prejudiciais à biodiversidade, em especial relacionados aos setores agrícola e de petróleo e gás.
👉🏾 Ampliação do Financiamento para a Biodiversidade: é essencial canalizar recursos para financiar as metas do Marco Global e propor mecanismos de transição que sejam politicamente aceitáveis e financeiramente viáveis.
👉🏾 Integração de Valores da Biodiversidade nas Contas Nacionais e Políticas Públicas: a integração de políticas por território e biomas, assim como a importância de melhorar o diálogo e a coleta de dados, deve ser base para uma tomada de decisão mais informada.
👉🏾 Repartição justa e equitativa de benefícios associados às Digital Sequence Information (DSI): evitar alteração do marco temporal para exigibilidade e garantir a indicação de que há conhecimento tradicional associado, junto com a origem geográfica, assegurando repartição de benefícios e consentimento prévio informado. Assegurar uma reparação pelo acesso de conhecimento tradicional nas DSI que sejam utilizadas sem possibilidade de rastreamento, sem consentimento prévio, e sem repartição de benefícios justa e equitativa.
Esses pontos refletem a necessidade de uma abordagem holística e inclusiva para a conservação da biodiversidade no Brasil, incorporando diferentes perspectivas e garantindo a participação de diversos atores sociais.
Sobre o Fórum
O Fórum sobre Florestas Tropicais de Oslo (OTFF) é uma conferência global que reúne governos, tomadores de decisão, instituições multilaterais, sociedade civil, povos indígenas e setor privado para promover ações na proteção das florestas tropicais. O OTFF 2024 celebrará os resultados dos países tropicais na implementação de políticas para reduzir o desmatamento e proteger a natureza, a gestão florestal dos povos indígenas e comunidades locais, ações para combater crimes contra a natureza e novas soluções para transparência e monitoramento florestal. A OTFF mostrará como estes resultados podem inspirar ações em outros ecossistemas e destacar desafios que necessitam de atenção da comunidade global. A participação é apenas mediante convite.