Nos dias 11 e 12 de junho, Brasília sediou o III Encontro Presencial do Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio). Com a participação de representantes de povos e comunidades tradicionais, organizações da sociedade civil e parceiros, o evento consolidou um momento importante de escuta, avaliação e definição de estratégias coletivas para o fortalecimento da rede e sua incidência nos espaços políticos e sociais do país — especialmente frente à crescente disputa por territórios e pela preservação dos modos de vida tradicionais.
A expressiva adesão foi um dos destaques do encontro, como afirmou a secretária executiva do ÓSocioBio, Laura Souza. “O que mais marcou nesta edição foi o envolvimento das instituições. Hoje, são mais de 20 organizações, com 56 participantes presentes no Encontro. Isso representa uma forte conexão com o movimento e com a rede para construirmos os próximos passos.”
Durante a programação, foram apresentados o histórico e os objetivos do ÓSocioBio, além de um balanço das principais ações realizadas entre 2024 e 2025. Andressa Neves, analista de conservação do WWF-Brasil, destacou os avanços conquistados. “Nesses três anos de rede, o contexto mudou. Hoje vivemos um momento mais positivo, e isso já gerou muitos frutos”.
Estudos de caso sobre diferentes formas de participação e papéis na rede promoveram um debate qualificado sobre o novo modelo de governança proposto. O WRI Brasil compartilhou dados inéditos do ÓSocioBio, e os participantes contribuíram com uma dinâmica de matriz de engajamento, fortalecendo o compromisso coletivo.
O encontro também marcou a entrada da Conexsus na coordenação executiva da rede, ampliando a pluralidade institucional e fortalecendo sua capacidade técnica e estratégica. A diretora executiva da Conexsus, Fabiola Zerbini, celebrou o novo ciclo. “Assumir esse papel na coordenação é um marco para a Conexsus. Estamos celebrando conquistas, renovando o grupo de entidades e planejando 2025 e 2026. Este é um ano estratégico — a COP30 é um momento importante, mas também é hora de pavimentar 2026 com a socioeconomia e as economias da sociobiodiversidade no centro da pauta política, econômica e cultural do país”.
Com uma programação intensa e participativa, o encontro revisitou os principais resultados da rede nos três primeiros anos, identificou desafios e consolidou estratégias para o próximo biênio. A atuação conjunta, a produção de conhecimento, a comunicação estratégica e a incidência política seguem como pilares da atuação do ÓSocioBio.
A pluralidade de vozes foi uma das marcas do evento. Um dos momentos mais emocionantes foi a cantoria de Dona Célia, da Rede de Povos e Comunidades Tradicionais do Maretório da Resex Mãe Grande de Curuçá, que encheu o auditório de força ancestral e resistência cultural. Ao final, um coquetel celebrou as alianças construídas e renovadas.
Fernando Moretti, líder de Crédito Socioambiental da Conexsus, avaliou: “Estamos comemorando três anos da rede com um olhar para tudo o que já foi feito, mas também para os desafios futuros. As economias da sociobiodiversidade precisam ser prioridade, uma política de Estado. Isso é essencial para os povos tradicionais e para o desenvolvimento do Brasil”.
O encontro reafirmou a importância da ação coletiva e articulada. Jeferson Straatmann (Camarão), analista sênior Sociobio, reforçou que o encontro marca a conexão entre movimentos sociais e organizações da sociedade civil. “Sozinhos, não conseguimos fazer a incidência necessária. São muitas realidades e biomas — por isso, é fundamental esse entendimento conjunto para planejar o futuro”.
Disputa em torno da COP30 e o papel estratégico do ÓSocioBio
O evento também abriu espaço para debates francos sobre o cenário político atual e seus impactos nos territórios e nos direitos dos povos da floresta, dos campos e das águas. A secretária executiva do ISA, Adriana Ramos, trouxe uma análise crítica sobre os riscos de captura da agenda da COP30 por setores conservadores. “A COP30 está em forte disputa. Para que ela seja uma oportunidade real, é preciso impedir que setores contrários aos direitos territoriais ganhem protagonismo. Se colocarem o uso da terra como foco da ação climática, passaremos os próximos dez anos disputando visibilidade e recursos. Precisamos garantir que a agenda da COP não seja capturada.”
Ela também alertou para o esvaziamento dos espaços autônomos da sociedade civil por ações governamentais fragmentadas. “Estamos vendo um festival de ‘jabuticabas’ — ideias que só existem no Brasil — tentando enfraquecer a mobilização coletiva. Precisamos garantir que a sociedade civil esteja nas ruas, com voz ativa, pressionando por direitos.”
Proteger os territórios é garantir o futuro do país
Dione Torquato, do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), destacou a urgência de dar visibilidade às economias dos povos tradicionais. “A proteção dos territórios e a garantia de direitos são fundamentais não só para a qualidade de vida dessas populações, mas também para construirmos uma relação equilibrada entre sociedade e natureza. Essa pauta se torna mais urgente a cada dia”.
O encontro foi encerrado com a criação de acordos coletivos de participação para o próximo ciclo. As falas, os dados e as dinâmicas desenvolvidas reforçam a centralidade do ÓSocioBio como articulação estratégica diante dos desafios do presente.
Mesmo diante de ameaças, ficou evidente a força e o potencial da rede. Como concluiu Adriana Ramos: “A existência do ÓSocioBio é uma nova frente de resistência e articulação. Esse exército aqui tem um enorme potencial”.