ÓSocioBio apresenta recomendações ao plano de combate ao desmatamento na Amazônia

Observatório, que reúne entidades da sociedade civil, movimentos sociais, empreendimentos e cooperativas de base comunitária, enfatizou temáticas ligadas às economias da sociobiodiversidade e sugeriu redação em defesa dos povos e comunidades tradicionais e agricultores familiares.
Atividades socioprodutivas como as das quebradeiras de coco babaçu, no Maranhão, são fundamentais para o combate ao desmatamento. Foto: Raisa Pina/Acervo ISPN

Criado para monitorar e apoiar a elaboração de políticas públicas voltadas aos povos e comunidades tradicionais e agricultores familiares, o Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio) foi uma das redes que apresentou contribuições à minuta preliminar do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm). O Plano foi retomado pelo governo Lula em janeiro, após ter sido extinto em 2019 pelo governo Bolsonaro (2019-2022).

O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), então, abriu consulta pública para recebimento de sugestões e novas redações ao Plano, para o período de 2023 a 2027, aos quatro eixos que o compõem: Eixo 1 – Atividades produtivas sustentáveis; Eixo 2 – Monitoramento e controle ambiental; Eixo 3 – Ordenamento fundiário e territorial; e Eixo 4 – Instrumentos normativos e econômicos. O ÓSocioBio apresentou recomendações aos eixos 1 e 4, indicando necessidades em cada componente.

No primeiro eixo, onde estão temáticas consideradas novidades no Plano em relação às versões anteriores, destacam-se ações no campo da bioeconomia e do desenvolvimento das cadeias produtivas na região amazônica, como do cacau e do açaí. No resultado esperado sobre “Bioeconomia, agroecologia e transição agroecológica ampliadas e fortalecidas na Amazônia”, por exemplo, foi sugerido o acréscimo da palavra “sociobiodiversidade” para demarcar que trata-se de uma atividade distinta da bioeconomia que vem sendo implementada no Brasil, conceitual e pragmaticamente.

Há também no mesmo eixo perspectiva de apoio a empreendimentos de base comunitária, para o desenvolvimento de negócios sustentáveis, com a previsão de instrumentos como um edital de aceleração de negócios de impacto social. A minuta apresenta ainda texto referente ao fortalecimento das políticas e programas de compras governamentais, relacionadas às políticas PAA, PNAE, PGPM, PGPM-Bio* e Selo da Agricultura Familiar – que precisam ser revisados para inclusão de mecanismos compatíveis com as economias da sociobiodiversidade.

“Analisamos que, neste caso, é preciso revisar a metodologia do cálculo do preço mínimo para os produtos da sociobiodiversidade com a inclusão de outros custos logísticos como armazenamento, transporte, energia, e custos de produção como a aquisição de equipamentos, materiais e utensílios, além do mero cálculo contábil da mão de obra, como vem sendo realizado”, destaca a secretária executiva do ÓSocioBio, Laura Souza.

Laura enfatiza ainda que com as proposições pretende-se abrir diálogo sobre as atividades socioprodutivas realizadas por PCTAFs, e assim assegurar que o plano preveja mecanismos que considerem o respeito e proteção aos modos de vida e práticas culturais nos territórios. “Está prevista na minuta prévia a criação de planos nacionais e programas, como o Plano Nacional de Desenvolvimento da Bioeconomia, que impactam diretamente a vida de povos indígenas, quilombolas, agricultores familiares. Por isso, nos posicionamos com esta preocupação”, completa.

Eixo 4

O Eixo 4 trata sobre instrumentos normativos que estão relacionados às práticas socioculturais das economias da sociobiodiversidade e à proteção territorial, como o pagamento por serviços ambientais (PSA). A ideia é que o PPCDAm fortaleça a regulamentação do PSA, bem como de outras áreas como a do mercado de carbono, com governança participativa e transparência de gestão. Além disso, que também possa ativar a criação de incentivos fiscais e de créditos  para os produtos provenientes das terras indígenas, dos territórios de povos e comunidades tradicionais e da agricultura familiar.

Neste contexto, o ÓSocioBio analisa, no documento enviado à consulta pública, que é necessário “descrever e expressar de forma clara os serviços prestados pelas comunidades tradicionais em seus territórios ou áreas de uso tradicionais, por meio de seus modos de vida e práticas tradicionais de manejo, em caso de contratos de concessão de uso de florestas públicas”. Quanto ao tópico sobre a negociação do “reconhecimento do patrimônio da biodiversidade preservado como produto comercializável”, o observatório acredita que:

“O patrimônio da biodiversidade é bem comum do povo brasileiro e sua conservação se deve em grande medida a povos indígenas e povos e comunidades tradicionais. A ideia desse patrimônio ser comercializável coloca em xeque muitos direitos e não deve ser realizada dessa forma”, assinam os membros do observatório.

O MMA informou que foram recebidas 540 contribuições à versão preliminar colocada para consulta pública. O objetivo é estruturar linhas de ação para que as taxas de desmatamento cheguem a zero até 2030. O acolhimento ou não das proposições feitas por diversos agentes que atuam na temática será pelo ministério.

Economias da Sociobiodiversidade

As economias da sociobiodiversidade são aquelas praticadas por povos e comunidades tradicionais, baseadas na diversidade, no conhecimento tradicional e inovação, nos sistemas socioprodutivos, seus produtos e serviços, conectados a seus modos de vida ancestrais, e ao bem viver das comunidades e seus territórios.

*PAA – Programa de Aquisição de Alimentos
PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar
PGPM – Política de Garantia de Preços Mínimos
PGPM-Bio – Política de Garantia de Preços Mínimos para Produtos da Sociobiodiversidade  

 

PPCDAm – Fase V
Fonte: Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima

Eixos

I – Atividades Produtivas Sustentáveis, que deverão retomar as políticas de exploração sustentável de florestas públicas, incentivos à restauração florestal, à bioeconomia, à agricultura de baixo carbono e ao estabelecimento de infraestrutura “verde”;

II – Monitoramento e Controle Ambiental, com retomada do controle de territórios ocupados por atividades ilegais, desintrusão de Unidades de Conservação e Terras Indígenas, implementação de instrumentos de apoio à fiscalização e melhoria da rastreabilidade de produtos agropecuários;

III – Ordenamento Fundiário e Territorial, com implementação do CAR, criação de Unidades de Conservação, titulação de territórios tradicionais, destinação de florestas públicas e avaliação ambiental de empreendimentos;

IV – Instrumentos Normativos e Econômicos para concretização das ações, como o Fundo Amazônia e o Bolsa Verde, pagamento por serviços ambientais e regulamentação de mercado de carbono e das cadeias de commodities e normas de reforço às ações de comando e controle em municípios críticos e em emergência ambiental por desmatamento.

 

Texto: Dominik Giusti/Assessoria de Comunicação ISPN